RUA GENERAL HERMES, 874

Rua General Hermes, 874
( 22 de janeiro de 2019)

Parei, ocasionalmente, na frente da casa n.º 874 da Rua General Hermes, no Bom Parto. Na verdade, naquele trecho, sempre pairava dúvida se já era o Bom Parto ou ainda era a Cambona. Na minha cabeça a Cambona somente iria até o Sesi. No trecho onde começava a antiga Brandini sempre achei que já era Bom Parto mesmo. Esse detalhe, porém, não era para ter importância para mim, exceto pelo fato de que, a contragosto, teria sido obrigado com minha família a sair da casa em que morávamos na Cambona para irmos morar no endereço mencionado no bairro contíguo. Fomos "expulsos" por causa de um desmoronamento da barreira que limitava o pequeno quintal da casa da Gazeta de Alagoas. Vi, assustado, junto com minha mãe, o monte de barro e vegetação descer, em meio a chuva, e invadir a cozinha, fazendo com que todos tivéssemos de sair correndo para a rua, evitando algo pior. Não havia mais condições de se morar naquele lugar. Foram muitos que tiveram que procurar outras moradias.
Tereza, minha irmã, foi quem sentiu mais a saída tão inesperada. Era comum vê-la pelos cantos chorando.
A casa da General Hermes era desconfortável, estreita e quente. Era uma pequena sala, um corredor que se estendia até a copa, deixando três quartos, o primeiro ocupado por papai e mamãe, o segundo pela família de meu irmão Rubem, e o terceiro acolhia minhas duas irmãs Renilde e Tereza, além de nossa tia Dolores que viveu conosco nos últimos anos de sua velhice. Eu e meu dois irmãos solteiros à época (Silas e Paulinho) dormíamos em "camas de campanha" que só eram armadas à noite, no corredor. Havia uma cozinha que ficava num local um pouco mais alto, espaço em que também havia o único banheiro da casa. O quintal que era bem maior do que o da casa anterior. Dele dava pra ver um trecho da pequena ladeira pela qual o povo tinha acesso a pé ao Alto da Conceição, no topo da barreira, esta localizada no lado esquerdo do antigo Bolão, onde hoje se estende a via Leste-Oeste.
A casa não tinha luxo e tinha um aspecto sombrio. Trago na mente flashes de alguns momentos que passamos ali que não foram agradáveis. A situação financeira não era boa, Minhas sobrinhas Silvana e Shirley já haviam nascido e tinham constantes crises de alergias, devido ao calor. A mais nova chorava à noite com cólicas intermináveis, o que fazia com que meu irmão muitas vezes saísse com ela em direção a um serviço médico de urgência da região, em plena madrugada. Nosso consolo era a fé. Nesse tempo, não obstante a crise, vivíamos um momento especial em nossa então comunidade cristã (Assembleia de Deus, do Farol). Todos éramos preenchidos espiritualmente pela presença marcante e inexplicável da graça de Deus. Muitas e muitas vezes chegávamos em casa de cultos que se estendiam até dez, onze horas da noite em que o quebrantamento do Espírito Santo nos fazia ficar "embriagados" como aqueles que se encontravam no Cenáculo no Dia de Pentecostes, da narrativa de Atos 2. Era comum um de nós começar a orar ajoelhado em sua própria cama e se quebrantar e sentir uma alegria inefável invadir a alma. Aquilo contagiava outro, e mais outro ou outra, e muitas das vezes amanhecíamos o dia em oração. Havia uma busca constante para viver uma vida de dependência do Espírito Santo, apesar das coisas não irem bem financeiramente. Isso era o que menos importava, o que a gente queria mesmo era ser cheio da graça e do amor de Deus.
O tempo passou, Rubem saiu com sua família para sua própria casa, Paulinho e Silas começaram a trabalhar e as coisas foram melhorando. Saímos dali e fomos morar de novo na Cambona, agora na Francisco de Menezes, numa casa mais ampla e mais arejada. Na noite em que parei em frente a casa da General Hermes, fiz uma oração de gratidão a Deus e, em meio a lágrimas, disse "como foram bons os dias em que vivi aqui. Muito obrigado. O Senhor nunca nos abandonou".

Comentários

  1. Que recordações lindas! Feliz é quem tem memória e sabe voltar a elas com gratidão nos coração.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Simples assim

"Frau"