Simples assim

Simples assim


Depois disso, quero viver coisas simples.
Quero sentar na areia da praia e, sem ter pressa, ficar lá por horas. Quero tocar na areia com minhas mãos, como se estivesse procurando não-sei-o-quê, só para vê-la escorrer entre meus dedos, sem achar nada.
Quero olhar para o horizonte como se procurasse... nada. 
Contar quantas gaivotas revoam um barquinho ancorado e outro que está mais a frente, ambos jogando ao sabor das pequenas ondas daquela tarde quente de verão. 
Quero ver o pôr do sol. Não sei de onde, mas quero. Quero me emocionar com as cores que variam do laranja para o âmbar e daí para incontáveis tonalidades de vermelho. Quero fixar o olhar no meio arco solar morrendo na linha infinita do horizonte, sem mesmo imaginar que o verei na manhã seguinte sobre minha cabeça. Desviarei vagarosamente meu olhar para a outra extremidade do céu, na perspectiva alvissareira de ver as primeiras fagulhas de estrelas piscarem no céu.
Quero dar as boas vindas às Três-marias, à Ursa menor, ao Cruzeiro do sul. Recuso-me a aceitar a ideia de que eles não existem mais, que apenas vejo a sua luz... Eu os vejo, logo existem. Sempre que os procuro, os encontro lá.
Vou ser mais atento aos outros. Vou olhar as pessoas nas ruas, contemplar suas faces descobertas sem quaisquer anteparos. Vou olhar profundo nos olhos delas. Quero ver sorrisos, quero ver lágrimas. Quero ouvir suas histórias, quero me emocionar com elas. Quero   que elas me ouçam também, vejam minhas lágrimas e sorrisos. 
Vou  falar coisas úteis e profundas. Mas também falarei tolices, anedotas e histórias repetidas que para mim fazem muito ou nenhum sentido.
Vou me calar. Não falar nada. Se necessário, também não ouvir. Ficar em silêncio comigo mesmo e o zumbido que já habita minha mente, avisando-me constantemente a proximidade do fim do prazo de validade. Pouco importa, que ele fique lá, não ligarei.
Dormirei cedo e dormirei tarde. Quando der sono. Lerei livros, verei filmes.  Mesmo que já os tenha visto antes, procurarei neles novas emoções e novos sentimentos. 
Arrumarei gavetas e estantes. Outras, preferirei vê-las desorganizadas mesmo, não há pressa.
Brincarei com meus filhos, aqueles que ainda gostam de brincar. Se não, brincarei com meus gatos e futuros netos.
Amarei ainda mais minha esposa. Tocarei suas mãos como se as tivesse tocando na juventude. Olharei seus olhos e sua alma profundamente. Beijarei sua face e seus lábios sem a avidez e pressa de outrora, mas com ternura e suavidade. Rirei com ela. Chorarei com ela. Viverei com ela. Viverei para ela. Ficarei feliz se ela vier comigo nessa viagem louca.

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